domingo, 6 de maio de 2012

Mais telefone do que gente

Com a privatização, em 1998, o Brasil deixou de ser um país no qual o telefone era privilégio de poucos. Com investimentos de mais de R$ 235 bilhões, desde então, o País já é o sexto mercado de telecomunicações do mundo

Nos anos 1990, a Bolsa do Telefone, de São Paulo, chegou a ser uma das empresas mais prósperas do País. Criada por um ex-executivo do mercado financeiro, essa companhia faturava alto negociando linhas telefônicas no mercado paralelo. A bolsa, que chegou a figurar entre as 500 maiores companhias nacionais, sobreviveu até a privatização, em 1998. Depois que o preço do telefone começou a despencar e as filas de espera por uma linha deixaram de existir, ela perdeu o sentido e fechou as portas. O Brasil, ao mesmo tempo, saía do atraso e inaugurava uma nova era. Em 2010, segundo dados da União Internacional de Telecomunicações (UIT), o Brasil tinha o sexto maior plantel de telefones do mundo, com 42 milhões de fixos e 202 milhões de celulares.

Em março deste ano, enquanto o número de fixos permanecia praticamente estável, o de celulares já estava em 250 milhões, muito acima da população brasileira. A privatização trouxe um elemento novo para o mercado: a concorrência. Na telefonia fixa, o território foi dividido em três. Para cada região foi criada uma operadora-espelho para concorrer com a principal – a GVT, espelho da Brasil Telecom, e hoje controlada pela francesa Vivendi, foi a única que deu certo. Além delas, havia a Embratel, para ligações internacionais. Na telefonia celular, a ideia era que houvesse dois concorrentes por Estado. Aqui, a competição ficou realmente feroz. “Hoje, todas operam em igualdade de condições”, diz Juarez Quadros, ex-ministro das Comunicações no governo Fernando Henrique Cardoso e sócio da Orion Consultores Associados.

Nenhuma operadora detém mais do que 30% de mercado, que é liderado pela Vivo, controlada desde 2011 pela espanhola Telefônica, seguida pela italiana TIM, pela mexicana Claro, do bilionário Carlos Slim, e pela brasileira Oi. Com a competição mais acirrada, os preços caíram e a qualidade dos serviços melhorou – embora ela ainda seja um dos nós da telefonia. Para participar do jogo, as operadoras foram obrigadas a investir para garantir a cobertura de norte a sul do País. A própria concorrência também obrigou as empresas a colocar a mão no bolso para não perder clientes. Entre 1998 e 2010, as operadoras investiram R$ 235 bilhões, o que dá uma média de R$ 18 bilhões por ano. É um valor seis vezes maior que os R$ 3 bilhões anuais aplicados no período anterior, entre 1972, ano da criação da Telebrás, e a privatização.

No ano passado, as operadoras investiram entre 18% e 20% da sua receita líquida, segundo levantamento feito pelo ex-ministro. A exceção foi a GVT, que investiu quase metade do que faturou. Uma das operadoras que mais crescem no País, a companhia controlada pela Vivendi possui uma carteira de clientes diferente das concorrentes. A grande maioria deles (mais de 90%) usa banda larga – e com velocidade acima de 10 MB. “Como tem uma vantagem tecnológica muito expressiva, ela está tomando clientes das outras operadoras”, diz Quadros. “Competir hoje é tirar clientes dos outros. E esse é um dos pilares da revolução na telefonia.” Para Luis Minoru Shibata, diretor da consultoria PromonLogicalis, essa guerra por clientes aumentou com a portabilidade. “A competição ficou ainda mais acirrada depois de 2008”, afirma Shibata. “Você pode mudar de operadora sem ter de trocar o número.”

Segundo ele, a portabilidade teve como subproduto uma sensível melhora na qualidade no atendimento. “Ninguém queria perder cliente.” Com o número de novas linhas móveis batendo recordes mês a mês e os modelos dos aparelhos cada vez mais sofisticados, permitindo acesso à internet, a demanda tornou-se explosiva no País. “Se você olhar para os terminais que estão lançando hoje (tablets, smartphones, tevês), eles vão exigir cada vez mais infraestrutura de telecomunicações”, diz Shibata. “As linhas vão começar a conectar não só pessoas, mas também coisas.” O maior problema está na banda larga. “A demanda é explosiva e a rede está sendo construída agora. Antes o sujeito ficava feliz com uma velocidade de 64 kbps. Hoje, um mega é pouco”, diz Eduardo Tude, diretor da consultoria Teleco.

As empresas não precisam só melhorar as estradas, mas também ampliá-las para suportar esse novo tráfego de voz e, principalmente, de dados. Até 2014, a Vivo, por exemplo, prevê investir R$ 24,3 bilhões na sua operação, mais de 50% do desembolsado nos quatro anos anteriores. A vice-líder TIM e a Oi, quarta do ranking, separaram quantias semelhantes para bancar sua expansão até a metade da década. O crescimento rápido também trouxe um problema: a má qualidade dos serviços. “Os dados caem toda hora, a voz picota”, critica Herberto Yamamuro, presidente da NEC do Brasil, uma das maiores fornecedoras de equipamentos para o setor. “Eu às vezes recebo SMS com três dias de atraso.” A questão, agora, não é mais quantidade. As redes precisam avançar na mesma medida dos aparelhos. O Brasil tem de se preparar para esse novo mundo.
Fonte: http://www.istoedinheiro.com.br/noticias/83147_MAIS+TELEFONE+DO+QUE+GENTE

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